A Igreja inicia o período da Quaresma com um ritual característico do povo da Antiga Aliança, utilizando as Cinzas, que são colocadas sobre a cabeça. Elas nos recordam a passagem do livro do Genêsis: "Tu és pó e ao pó voltará", sinal da nossa finitude nesse mundo. O povo de Deus as utilizava, jogando sobre o corpo, reconhecendo sua pequenez e pedindo perdão a Deus pelas faltas cometidas - era um sinal de dor, sofrimento e penitência. Vejamos alguns exemplos: no livro de Ester, Mardoqueu se veste de saco e se cobre de cinzas quando soube do decreto do Rei Asuer I (Xerxes, 485-464 antes de Cristo) da Pérsia que condenou à morte todos os judeus de seu império. (Est 4,1). Jó (cuja história foi escrita entre os anos VII e V antes de Cristo) mostrou seu arrependimento vestindo-se de saco e cobrindo-se de cinzas (Jó 42,6). Daniel (cerca de 550 antes de Cristo) ao profetizar a captura de Jerusalém pela Babilônia, escreveu: “Volvi-me para o Senhor Deus a fim de dirigir-lhe uma oração de súplica, jejuando e me impondo o cilício e a cinza” (Dn 9,3). No século V antes de Cristo, logo depois da pregação de Jonas, o povo de Nínive proclamou um jejum a todos e se vestiram de saco, inclusive o Rei, que além de tudo levantou-se de seu trono e sentou sobre cinzas (Jn 3,5-6). Como a Quaresma é o "tempo de conversão", nós repetimos esse mesmo gesto, não superficialmente, mas repleto de sentido, pois estamos pedindo perdão e assumindo uma motivação interior para mudar de vida, de atitudes, com gestos externos e internos de penitência, em busca da Páscoa da Ressurreição, como vitória de Cristo e a nossa, sobre o pecado e a morte.
A Quaresma dura 40 dias. O número 40 na Bíblia relembra o aspecto de passagem. Relembremos alguns desses momentos bíblicos: quarenta dias do dilúvio, dos quarenta anos de peregrinação do povo judeu pelo deserto, dos quarenta dias de Moisés e de Elias na montanha, dos quarenta dias que Jesus passou no deserto antes de começar sua vida pública. Indica também que o cristão percorre um caminho para fazer uma passagem, da morte, consequência do pecado, para a vida, fruto da Ressurreição de Cristo.
Nas igrejas, capelas, catedrais, a cor utilizada é a roxa, que liturgicamente lembra penitência. É a mesma cor utilizada no período do Advento, quando a Igreja espera ansiosa o nascimento do Menino Deus. Não se canta o glória, nem o aleluia, as palmas são suprimidas, o ambiente é despojado, sem flores ou pompa, tudo para introduzir a assembleia nesse clima sereno, característico desse tempo.
Quaresma é tempo de enxergar o mundo com o olhar da fé, tendo como base aqueles três elementos basilares: jejum, oração e caridade. Que as nossas atitudes reflitam essa abertura ao mistério de Jesus, que nos permite contemplar a sua glória após o carregamento da cruz nossa de cada dia. Estejamos cientes da importância desse tempo. Deus nos dá uma chance para revermos nossos conceitos e escolhas.
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